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Marcas e Política. Qual o risco desta mistura?

Em um artigo publicado no Meio e mensagem, Jaime Troiano comenta que este é um daqueles assuntos em que é tão importante como arriscado compartilhar um posicionamento público.


Há poucos dias, um repórter me perguntou até que ponto eu julgava pertinentes as manifestações de marcas sobre temas de natureza essencialmente política. O episódio recente da invasão do Capitólio em Washington foi a razão da pergunta. Marcas como Chevron, Coca-Cola, Ben & Jerry´s falaram sobre a insensatez do que aconteceu. Mas o Capitólio foi apenas um exemplo.


Assim que o repórter fez a pergunta, fui ao espelho e, vacilante, me olhei:


Jaime, você tem uma opinião formada a respeito, não tem? Então, melhor dizer o que pensa, porque o silêncio, nesse caso, é um péssimo conselheiro.

Então, aqui vai o que eu penso. Acredito que o supremo compromisso das marcas é com a sociedade e não com o mercado. Aliás, estou convencido de que mercado é a expressão que apenas representa uma abstração técnica que esconde sua verdadeira realidade e natureza: gente.


Pois bem, o compromisso com a sociedade exige, em primeiríssimo lugar, que as marcas estejam enraizadas em valores e princípios legítimos, de que ela não apenas fala, mas pratica. Ou, como se diz em inglês, as empresas precisam walk the talk. Cumpram seu mandato principal: atender clientes e consumidores.


Se além de fazer isso bem feito, se além de serem competentes ao entregar sua “lição de casa corretamente", julgarem que devem participar da arena política, a exigência muda de patamar.


A primeira condição sine qua non, para entrar, ainda que eventualmente nessa arena, é: nunca seja oportunista. Com toda a transparência que o mundo digital nos franqueou, os arrivistas são descobertos muito antes do que eles podem supor. E o pior é quando são desmascaradas dentro de casa, isto é, quando os próprios colaboradores sabem que as belas frases de sua manifestação pública são uma conversa de cerca-lourenço.


A segunda condição é clareza interna sobre si mesma. “Só quem conhece suficiente e honestamente o que a empresa representa diante da sociedade tem o direito de agir diante do mundo e dizer o que os outros deveriam fazer. Quem não tem clareza sobre a natureza do seu Propósito, não consegue alinhar seu discurso externo e nem sua comunicação de forma coerente com ele. Além disso, não nos esqueçamos, o Propósito tem um poder central na vida de uma organização, mesmo assim não serve de apoio para iniciativas estabanadas e muito menos oportunistas. É como as baionetas, na frase atribuída a Napoleão:


Com as baionetas, pode-se fazer tudo, menos uma coisa: sentar-se sobre elas”.

E a terceira condição é estar preparada para enfrentar outra frente de batalha. É a frente da consistência política e também ideológica. Por mais que segmentos internos da organização pressionem para que ela se envolva em discussões públicas e políticas, muita calma nessa hora! Os gestores, embora tenham que ser sensíveis a demandas dessa natureza do seu quadro de colaboradores, respirem fundo antes de dar esse passo. A empresa e suas marcas não podem ser uma biruta como as de aeroportos que só acompanham a direção do vento.


Em resumo, política e marcas são uma mistura meio explosiva. Acabei de ler no Estadão (18/01/2020) o seguinte: “O Ministério Público Federal formalizou na sexta-feira passada o arquivamento do inquérito aberto contra a Volkswagen pelo apoio da montadora alemã à repressão durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985).” Em troca da não proposição de ações penais, a empresa deverá arcar com uma multa de R$ 36,3 milhões para ex-trabalhadores que sofreram sob a ditadura.


Ou seja, além de explosiva, a mistura pode sair cara.


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